quarta-feira, 14 de outubro de 2020

Consulta: Vocação Para Gueixa

 (Publicado em 31 de janeiro de 2012)


O Sr. uma vez escreveu, acho que no seu livro “O amor companheiro”, que todas as mulheres esperam 100% de  dedicação e entrega de seus homens, mas que se eles cederem a isso, serão imediatamente desprezados por elas. Mas eu tenho vocação para gueixa, quero que meu marido saiba que sou 100% dele, quero agradá-lo completamente, me entregar a ele. Corro o mesmo risco?

Não. Os homens são diferentes das mulheres. Você tem o que se chama de “servidão voluntária”, o que é encantador para a maioria dos homens. Os homens sonham com mulheres que os admirem, que queiram entendê-los, que se entreguem a um amor incondicional, como o das mães, que não os cobrem nem os critiquem. Seu exemplo da gueixa não é por acaso. As mais bem sucedidas no Japão recebem uma fidelidade incomparável de seu “Domo”, seu senhor. É claro que há aqueles que precisam de uma mulher desafiadora, a quem precisem conquistar a cada momento, como um reflexo de seu fetiche. As feministas da igualdade vão se irritar com isto, vão querer me massacrar. Mas sua postura acolhedora do “descanso do guerreiro” permite que você seja feliz como dona de casa, porque isto é uma escolha sua. Não é que seja “a postura certa” aplicável para todas. Mas a grande maioria das mulheres traz dentro de si um ovo de jararaca, que eclode e ganha força frente a um marido banana. Se a jararaca ficar forte, elas serão infelizes. Quanto mais banana comerem, mais jararacas ficarão. Eis porque os homens precisam manter uma tensão, ao não se entregarem por inteiro. Isto mantém o desejo delas por eles, porque o admiram, pois não o dominam. Sua estratégia, fruto do seu desejo, pode ser fonte de felicidade.

Consulta: Jovem Romântico

 (Publicado em 31 de janeiro de 2012)


Tenho 16 anos e algo que me parece uma esquisitice: meus olhos são atraídos pelos rostos das meninas, e, num segundo lugar distante, pelos seus seios. Me fascino pela beleza facial e pela expressão de inteligência que vejo nelas. Não posso confessar isto a meus colegas que vivem elogiando peitos e bundas. Eles iriam me massacrar. Tenho algo de errado?

Nada. Você é um romântico, e existe um preconceito contra o romantismo em quase todas as tribos de adolescentes. “Homem tem tesão, quem tem amor é viado”, parece ser o senso comum entre a maioria das tribos. Infelizmente, quando o adolescente não recebe apoio dos pais para suas singularidades, adota tribos como sua família. As tribos costumam ser tirânicas e impõem comportamentos iguais para todos (como costumam fazer todas as tiranias). Aposto que vários de seus colegas têm sentimentos secretos como você, e se apavoram de mostrá-los, porque têm que ser “iguais” ao pensamento dominante de seus pares. Você vive um problema político chamado totalitarismo. Ele anula o conceito de indivíduo e é muito mais sério do que você pensa. Aqui no Rio uma tribo espancou uma empregada doméstica, e estou seguro de que eles agiram por uma idéia comum imposta. Nenhum teve coragem de se contrapor ao grupo. Minha sugestão é que você escolha melhor seus amigos, segundo suas afinidades, e não por medo de ser minoria.

Consulta: Graus de Preferência Sexual

 (Publicado em 31 de janeiro de 2012)


Quando eu era adolescente, 17 anos, um primo mais velho (30 anos) de quem eu gostava muito começou a ser cada vez mais carinhoso comigo. Um dia ele disse que me amava, que queria me dar prazer, e que ia me ensinar como. Ele foi extremamente amoroso e cuidadoso, e eu gostei tanto que sempre me entreguei. Nossa relação durou até os meus 20 anos, quando tive a primeira namorada e parei com aquilo, porque me parecia traição. Mas a verdade é que me lembro dele com amor e saudade. Qual é a minha verdadeira sexualidade?

Leroy (pseudônimo, desculpe)

Pelo resto da sua carta, entendi que você nunca se sentiu atraído por outro homem, nem antes, nem depois. É capaz de você ser um hétero daqueles para quem o desejo homo nem é um assunto. Mas parece que o senso comum às vezes te põe uma pulga atrás da orelha. Você deve ter erotismo anal, nada incomum em héteros, apesar de eles desconfiarem disso. Seu primo tinha desejo homo, mas era masculino, forte e protetor. Creio que vocês tiveram uma história de amor como as da Grécia clássica: o amor parental expressado em desejo pleno de delicadeza. É uma força poderosa. O protegido encontrando o protetor que lhe ensina, e acolhe suas fragilidades com respeito. O prazer de ser passivo é algo perturbador para os héteros (acham que isso é coisa só de gay). A sexualidade humana é complexa e rica, cada indivíduo tem a sua. Aproveite em paz suas belas lembranças.

Consulta: Vergonha Obsessiva

 (Publicado em 31 de janeiro de 2012)


Meu filho foi atacado por um cão aos 6 anos. Isso lhe deixou uma cicatriz na têmpora direita de 3 cm. Ele a ignorou até quando fez 13 anos, quando passou a se preocupar com ela de maneira exagerada, achando que, principalmente as meninas, iam-lhe achar uma espécie de fantasma da ópera. Isso lhe ocupou a cabeça ao ponto de tentar lixá-la aos 16 anos. Foi mal sucedido e entrou em desespero. O que se pode fazer?

Alaíde

O problema de seu filho não é a cicatriz. É algo chamado de “crise evolutiva”. São momentos em que ficamos entre o mundo que nos chama, e o medo que temos dele. Passamos por ela ao entrar para o colégio pela primeira vez. Eis o porquê da adaptação. Outras se dão quando da entrada da adolescência (o caso de seu filho), porque passamos a nos interessar pelo sexo, e pela nossa cotação no mercado; na escolha da faculdade; na saída da faculdade e procura de sustento; no casamento; no nascimento de filhos; nas separações; nas mudanças profissionais; na aposentadoria; na menopausa, na constatação da velhice e proximidade da morte. Seu filho teve uma dessas, o medo do mundo vencendo, agravada provavelmente por uma depressão e um transtorno obsessivo. Sugiro, em primeiro lugar, que ele seja medicado por um psiquiatra. Aliviada sua dor (como o será, pelos remédios), que ele seja encaminhado para uma psicoterapia que terceirize a função de pai e o ajude a se socializar. Não é vergonha nenhuma, todos temos nossas limitações, e reconhecê-las é uma bênção para nossos filhos.

Consulta: Cotas Raciais

 (Publicado em 31 de janeiro de 2012)


O que o Sr. tem a dizer sobre as cotas raciais?

Arnoldo

Minha filha recebeu um questionário do colégio que exigia que ela declarasse sua raça. Ela ousou declarar que sua raça era “humana”. A professora passou-lhe um carão. Quando me contou isso, disse-lhe que ela havia repetido o gesto de Einstein, diante da mesma pergunta em Ellis Iland, quando de sua entrada nos USA. O conceito científico de raça diz respeito àqueles indivíduos que podem se cruzar e dar crias sem problemas. As diferentes etnias são subespécies. Resulta que todos os seres humanos são da mesma raça. Mas assim mesmo temos preconceitos. Com o quê, afinal? Quem se lembra dos tempos de colégio poderá responder a isso sem dificuldades. Temos preconceitos com os diferentes de nossa tribo. Quem usava óculos no colégio era chamado de “quatro-olhos”; os mais baixos de “tampinhas”, e assim por diante. Na antiguidade, um desconhecido era enfrentado até à morte, e mesmo hoje em dia, na Nova Guiné, se dois desconhecidos se encontram, passam horas buscando parentes em comum para não terem que se matar. Se você é branco e encontrar um branco tatuado, com piercings, musculoso e mal-vestido, vindo contra você na mesma calçada de uma rua escura, sua tendência é trocar de calçada. Se você é branco e encontrar um negro de meia-idade, de terno e com uma pasta na mesma calçada, seguirá adiante sem aflições. Ali Kamel, um articulista que admiro, tem mostrado que nosso problema é mais com a pobreza do que com a cor (não que a cor seja insignificante), e que, se houver cotas, que elas favoreçam os pobres em geral, e não os que se diferem pela tonalidade da pele. Tudo o que não queremos é importar o ódio americano pelas diferenças de cor.

Consulta: Masturbação é Traição?









 (Publicado em 31 de janeiro de 2012)


Descobri que meu marido se masturba. Estamos casados há 26 anos e nossas relações sexuais são raras. Ele me trai com suas fantasias e estou muito decepcionada, para não dizer pior, com ele. Eu estou sempre aqui. Por que ele não procura uma mulher real como eu, e tem que pensar em vagabundas? Devo pedir divórcio?

Norma

Não, Norma, não! É hora de alguém te contar os fatos da vida. Seu marido criou seus filhos com você, tem sido companheiro, amigo, FIEL a você (depois eu explico), provedor e carinhoso, como você me explicou na versão mais longa de sua carta. O que acontece é que ele é um homem, diferente e, por vezes, até antagonista de uma mulher na guerra dos sexos. A vida sexual dos homens é, principalmente, a masturbação. É a saída que eles encontraram para a monogamia. A seleção natural construiu o homem para ter harém, como continua acontecendo no Oriente médio. Ismael, o sanguinário, Imperador do Marrocos, teve 1400 filhos com o seu. Se fosse uma mulher, teria no máximo 68 (de uma soviética do século XIX, especialista em trigêmios). Mas ele era riquíssimo. A monogamia é uma imposição política em prol da atenuação da inveja dos ricos, que os homens absorvem com relutância biológica. A masturbação, além de expulsar espermatozóides inférteis, é o mais digno pilar da monogamia, é o que mantém seu marido próximo sem amargor. Deixe-o ter devaneios próprios. Você também não os tem?



Consulta: Normalidade

 Tenho um ótimo relacionamento com meu namorado, inclusive sexual. Há pouco tempo ele me contou ter fantasias com travestis.

Pior, já concretizou, saindo com um deles e ter feito sexo oral. Ao mesmo tempo, jura não sentir atração por homens. Isso é normal? O que significa?

Tati

Normalidade? É sempre complexa para nós, já que nosso cérebro é o que existe de mais complexo no planeta. Seu namorado tem, como diz um cliente, uma “conta secreta na Suíça”. Quer dizer que parte de seu capital erótico está ligado ao desejo homo. Quando o valor dessa conta passa dos 50%, a pessoa se sente tentada a “sair do armário”, a se “assumir” como principalmente homossexual, a conta deixa de ser secreta e é investida no país. Mas, e se ele tem 20%? Por que razão haveria de se rotular? Por que haveria de renunciar a ter mulher e filhos se este é seu maior interesse? A maior parte dos homens nesta situação opta por manter a conta secreta, reprimida, escondida até de si mesmo. Quanto menor a conta (abaixo dos 50%), maior a facilidade de mantê-la secreta, e menores os danos colaterais (como sair por aí perseguindo homossexuais, numa negação de seu capital homo). São raros os que resolvem usar a conta, mais raro ainda quem decida partilhar o segredo com a pessoa que amam. É preciso ser muito “macho”, é preciso que a conta seja baixa. Ele deseja não ter segredos com você, e ser aceito tal como é. Seus olhos se atraem pelo corpo das mulheres (sinal de que a conta é baixa). Ele arranjou uma solução de meio termo: uma mulher que o atrai, mas que tem pênis. Você não tirou “la mala suerte”, ao contrário.